17 agosto 2013

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Territórios remanescentes de quilombos - 4ª Série

A palavra quilombo é originária do idioma africano quimbundo, que significa : “sociedade formada por jovens guerreiros que pertenciam a grupos étnicos desenraizados de suas comunidades”
O Território Remanescente de Comunidade Quilombola é uma concretização das conquistas da comunidade afro descendente no Brasil, fruto das várias e heroicas resistências ao modelo escravagista e opressor instaurado no Brasil colônia e do reconhecimento dessa injustiça histórica. Embora continue presente perpassando as relações socioculturais da sociedade brasileira, enquanto sistema, o escravagista vigorou até 1888 e foi responsável pela entrada de mais de 3,5 milhões de homens e mulheres prisioneiros oriundos do continente africano – embora haja discrepância entre as estimativas apresentadas, Sérgio Buarque de Holanda faz uma análise das mesmas considerando este um número sensato. Além de oriundos dos antigos quilombos de escravos refugiados é importante lembrar que muitas das comunidades foram estabelecidas em terras oriundas de heranças, doações, pagamento em troca de serviços prestados ou compra de terras, tanto durante a vigência do sistema escravocrata quanto após sua abolição.


Os remanescentes de quilombo são definidos como grupos étnico-raciais que tenham também uma trajetória histórica própria, dotado de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida, e sua caracterização deve ser dada segundo critérios de auto- atribuição atestada pelas próprias comunidades, como também adotado pela Convenção da OIT sobre Povos Indígenas e Tribais .

A chamada comunidade remanescente de quilombo é uma categoria social relativamente recente, representa uma força social relevante no meio rural brasileiro, dando nova tradução àquilo que era conhecido como comunidades negras rurais (mais ao centro, sul e sudeste do país) e terras de preto (mais ao norte e nordeste), que também começa a penetrar ao meio urbano, dando nova tradução a um leque variado de situações que vão desde antigas comunidades negras rurais atingidas pela expansão dos perímetros urbanos até bairros no entorno dos terreiros de candomblé. 


Atualmente, há mais de 2 mil comunidades quilombolas no país2, lutando pelo direito de propriedade de suas terras consagrado pela Constituição Federal desde 1988. A tabela abaixo especifica o número de comunidades por estado, atualizado até 2006.



A Constituição inclui como patrimônio cultural brasileiro as formas de expressão, os modos de criar, fazer e viver, as criações científicas, artísticas e tecnológicas, as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinado as às manifestações artístico-culturais e os (..) sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico, garantindo o pleno exercício dos direitos culturais e responsabilizando o Estado pelo apoio, proteção, valorização e difusão das manifestações culturais indígenas, afro-brasileiras e de outros grupos do processo civilizatório nacional.

Embora desde 1988 a Constituição Federal do Brasil já conceituasse como patrimônio cultural brasileiro os bens materiais e imateriais dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, foi no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias  que foi reconhecido o direito dos remanescentes das comunidades dos quilombos que estivessem ocupando suas terras ter a propriedade definitiva da mesma, devendo o Estado emitir-lhes títulos respectivos.

Entretanto, foi apenas em 2003, através do Decreto Federal Nº 4.887 8 que foi regulamentado o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos, sendo o Incra o órgão competente na esfera federal, havendo competência comum aos respectivos órgãos de terras estaduais e municipais. A identificação dos limites das terras das comunidades é feita a partir da avaliação conjunta das indicações da própria comunidade e de estudos técnicos e científicos, inclusive relatórios antropológicos, constituindo na caracterização espacial, econômica, ambiental e sociocultural da terra ocupada pela comunidade (Art. 9).

Embora a regulamentação em âmbito federal tenha ocorrido apenas em 2003, alguns estados, adiantaram-se em relação à União neste aspecto, como o estado do Pará, por exemplo, que em 1999 já tinha seu procedimento para a legitimação de posse das Terras dos Remanescentes das Comunidades dos Quilombos (Decreto Estadual N.º 3.572 de 1999 ).

Atualmente é reconhecida a existência de comunidades quilombolas em 24 estados brasileiros, entretanto, a atualização deste repertório legal realizada em outubro de 20082 indica que apenas 18 deles possuem algum instrumento legal que versa sobre essas comunidades ou suas terras, sendo eles: Amapá, Bahia, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo e Sergipe. Esses documentos variam entre Constituições, Leis e Instruções Normativas, dentre outros, com diferentes pesos legais e graus de implementação.

O Incra, até agosto de 2010, reconhecia 104 Territórios Quilombolas com títulos expedidos em 14 estados da federação, os quais contemplam 183 comunidades e mais de 11.500 famílias, abrangendo mais de 970 mil hectares.11 Veja a relação de Territórios Quilombolas brasileiros com títulos expedidos, número de famílias em cada um, estado da federação e municípios em que se localizam em todo o território brasileiro.11 Veja mais clicando aqui.
Segundo dados da Comissão Pró-Índio de São Paulo, em dezembro de 2009, 90% dos 942 processos administrativos abertos no Incra aguardava pela conclusão do relatório de identificação do território (RTID) - a primeira etapa do processo de regularização. E 76% deles não havia sido alvo de qualquer providência além de receber um número de protocolo. Por isso é que em oito anos de governo do PT foram tituladas apenas oito terras de quilombos. Nesse mesmo período (janeiro de 2003 a dezembro de 2009), o governo do Estado do Pará emitiu 25 títulos, o do Maranhão 20, o do Piauí cinco, e o de São Paulo, três. Juntando-se tudo, somente 13% das terras cadastradas na Fundação Cultural Palmares conseguiram, até hoje, a titulação, sendo que a imensa maioria se deu pelo trabalho dos governos estaduais. Leia mais...
Um grande desafio relacionado aos Territórios, é a sobreposição com outras áreas protegidas, como Unidades de Conservação.

Territórios Quilombolas no Ribeira 

No século XVI as bandeiras de mineração iniciaram suas expedições partindo do litoral sul do Estado para o interior do Vale do Ribeira, levando junto indígenas e alguns escravos negros.12  Desde então, diferentes ciclos econômicos, valores socioculturais e padrões de ocupação do espaço sobrepuseram-se, tornando a híbrida paisagem atual do Vale a região com maior número de fragmentos florestais remanescentes de Mata Atlântica e aonde se encontra a maior parte das comunidades quilombolas do estado de São Paulo.




Saiba mais sobre os Territórios Quilombolas no Vale do Ribeira no site criado pelas comunidades quilombolas, com apoio e assessoria do Instituto Socioambiental (ISA).

Saiba mais
Agenda socioambiental de comunidades quilombolas do Vale do Ribeira . 

Cartilha 'Cidadania Quilombola' fruto de parceria entre a Secretaria Especial dos Direitos Humanos (SEDH), vinculada à Presidência da República e o Instituto Socioambiental (ISA). Disponível clicando aqui .

Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária. Instrução Normativa Nº 56, de 7/10/2009. Regulamenta procedimento para o reconhecimento de terras ocupadas por remanescentes das comunidades quilombolas.



Referências
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HOLANDA, S. B. . "Africanos no Brasil". Folha da Manhã, 02 de agosto de 1950.
Comissão Pró Índio de São Paulo (CPI SP) . Acesso ao site em março de 2010.
MOURA, G. 2006. Quilombos contemporâneos no Brasil in Brasil/África: como se o mar fosse mentira. CHAVES, R., SECCO, C., MACEDO, T.. São Paulo: Ed. Unesp. Luanda/Angola: Chá de Caninde.
VELÁSQUES, C.. "Quilombolas". In: RICARDO, B. e CAMPANILI, M. (Ed.). Almanaque Brasil Socioambiental 2008. Instituto Socioambiental. 2007. P. 234-235.
ARRUTI, J.M. P. A. 2006. Mocambo: antropologia e história do processo de formação quilombola. Bauru, SP. Edusc. 370p.
ANJOS, R.S. 2006. Quilombolas: tradições e cultura da resistência. São Paulo. Aori Comunicações.
BRASIL. 1988. "Ato das Disposições Constitucionais Transitórias: promulgada em 5 de outubro de 1988". Coletânia de Legislaçao Ambiental e Constituição Federal. Organização: Odete Medauar. 7ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2008. Coleção RT MiniCódigos. 1117p.
BRASIL. 2003. Decreto Federal Nº 4.887 de 20/11/2003 . Regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos de que trata o art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.
BRASIL. 1988. "Constituição da República Federativa do Brasil:  promulgada em 5 de outubro de 1988". Coletânia de Legislaçao Ambiental e Constituição Federal. Organização: Odete Medauar. 7ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2008. Coleção RT MiniCódigos. 1117p.
PARÁ, 1999. Decreto Estadual N.º 3.572 de 22/07/1999. Regulamenta a Lei nº 6.165 de 02/12/1998, que dispõe sobre a legitimação de terras dos remanescentes das comunidades dos quilombos e da outras providências.
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) . Acesso ao site em agosto de 2010.
CARRIL, L.F. 1995. Terras de Negro no Vale de Ribeira: Territorialidade e Resistência. São Paulo, FFLCH/USP. Dissertação de mestrado.    

Fonte:http://uc.socioambiental.org/territ%C3%B3rios-de-ocupa%C3%A7%C3%A3o-tradicional/territ%C3%B3rios-remanescentes-de-quilombos

Um comentário :

  1. Oi, Sol, adoro esse tema, afinal eu tbm tenho um pé na senzala, rsrsrsrsrs
    amei esse blog, e ja estou te seguindo...bjus e uma ótima semana....

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Olá! Que bom que você veio e que legal que me deixou um recadinho! Respondei o mais breve possível por email.Muito obrigada e volte sempre!

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